Resumo: Artigo 36227
Encenar, desenhar e debater futuros: os desafios das ciências e tecnologias emergentes (11, 57, 58, 94, 104, 108)
João Nunes, Marisa Matias, Angela Filipe, Centre for Social Studies, University of Coimbra, Portugal.
Apresentação: Thursday, May 29, 2008 1:15PM - 3:15PM sala 203 - UNIRIO VII ESOCITE - Sessão 4 - Chair: Arthur Ferreira
Abstract.
O desenvolvimento das ciências e tecnologias emergentes, como as nanociências e as nanotecnologias, passa, no momento presente, pela proliferação de notas promissórias e de cenários para o futuro. O resgate das primeiras e a realização dos segundos serão o resultado contingente da articulação de actividades de pesquisa e desenvolvimento, da definição de políticas públicas e de decisões de investimento público e privado. Na actualidade, e apesar de algumas inovações que estão sendo incorporadas em novas tecnologias e materiais em alguns produtos de consumo, as nanociências/nanotecnologias continuam sendo, em boa parte, dominadas por enfoques de tipo exploratório. É notória, nesta situação, a preocupação explícita entre os actores envolvidos no domínio das nanociências/nanotecnologias os nanoenactors com as implicações éticas, sociais e jurídicas dos novos saberes e tecnologias. Essa preocupação não é nova, e episódios recentes de inovação científica e tecnológica, em domínios como, por exemplo, a biotecnologia, suscitaram importantes debates públicos em diferentes países e continentes, geralmente realizados a jusante do processo de pesquisa e de desenvolvimentos de produtos comercializáveis. Há, pois, algo de novo no esforço actual de lançar esse debate público a montante do processo de pesquisa e de inovação, de modo a que possam ser discutidas as opções sobre direcções de pesquisa e de desenvolvimento e ser avaliados os benefícios e os riscos possíveis ou prováveis associados a essas opções, assim como as suas consequências para a organização social. Esse debate passa, como sucedeu no caso da biotecnologia, pela criação de espaços que permitam nele incorporar os cidadãos, as suas preocupações, concepções éticas, experiências e saberes. As características específicas das nanociências e nanotecnologias suscitam, contudo, novas interrogações e desafios sobre as formas mais adequadas de organizar e realizar esse debate público a montante. No âmbito do projecto Europeu DEEPEN (Deepening Ethical Engagement and Participation in Emerging Nanotechnologies), têm sido desenhadas e ensaiadas metodologias experimentais de envolvimento dos cidadãos no debate e na deliberação sobre as trajectórias possíveis, os benefícios e os riscos da pesquisa e desenvolvimento em nanociências/nanotecnologias. Os cenários disponíveis no início do projecto como referências para o debate eram, quase exclusivamente, cenários criados pelos cientistas e pesquisadores e/ou pelos seus críticos ou cenários de ficção científica. O desafio de construir cenários e de configurar situações problemáticas a partir das experiências e preocupações de diferentes públicos levou ao desenho e desenvolvimento de procedimentos experimentais inspirados no trabalho de Paulo Freire e de Augusto Boal, recorrendo a técnicas de teatro-imagem e de teatro fórum ou a oficinas de construção partilhada de cenários. Os materiais produzidos por essas iniciativas experimentais serviram, por sua vez, de contribuições para o debate em fóruns deliberativos. Os procedimentos utilizados permitem responder a duas limitações dos exercícios de avaliação participativa de tecnologias que têm sido mais utilizados na Europa, como as conferências de consenso ou os júris de cidadãos. Por um lado, eles possibilitam a construção de cenários pelos próprios participantes, em lugar de depender da avaliação de cenários propostos por especialistas; por outro lado, eles permitem uma maior integração e diversificação dos públicos em experiências de participação, questionando a hegemonia da argumentação racional e da deliberação nos processos de debate público e incorporando outros recursos, performativos ou narrativos, por exemplo, ampliando assim as condições de envolvimento dialógico dos participantes. Os trabalhos de Freire e Boal constituem, nesta perspectiva, importantes contribuições, forjadas, principalmente, em contextos latino-americanos, para a transformação das condições e formas do debate público sobre ciência e tecnologia na Europa.